Ela, naquela sexta-feira chuvosa abrigou-se em minha casa, não havia porque eu negar, ela era estonteantemente linda, com seu metro e sessenta e cinco, cabelos castanhos avermelhados, olhos enigmáticos e lábios que se moviam como duas bailarinas russas em O Lago dos Cisnes, o preto e o branco harmoniosamente dançando em sua boca.
E quando ela bateu em minha porta, ainda hesitei em não atender - devendo três meses de aluguel e conhecendo o senhorio do imóvel muito bem, sei que a chuva não seria problema para o tal - resolvi espiar o olho mágico - não faço ideia se é clichê demais eu colocar aqui "amor a primeira vista", mas há quem goste de clichês, e há quem acredite em amor a primeira vista.
Parada ali estava ela, molhada, impaciente e já quase desistindo quando vi ela virar seu corpo minusculo retraído do frio, abraçando-se na tentativa de esquentar-se em vão. Abri a porta.
Quando um homem se apaixona, ele fica bobo, não importa quantas faculdades tenha, quantos diplomas expostos na parede, quanta experiência de vida, se ele estiver apaixonado, ele estará certamente bobo. E eu? Que já sou bobo de nascença no auge de meus vinte e nove anos. As próximas palavras que diria seria a prova clara de minha tese.
- Foi você quem bateu agora?
Quem diabos pergunta isto a unica pessoa próxima a sua porta em dia de tempestade diluviana? O que eu esperaria como resposta? Que não? Você leitor, deve estar pensando agora: "Ah, mas poderia ter sido uma pergunta retórica". Eu como autor da frase que vos escreve afirmo categoricamente que não foi uma retórica, o que torna o meu estado ainda mais estupido.
- Sim (...) - pronto, a partir de agora minha atenção foi-se a sua boca, não pelo que ela falava, no momento não me importava tal oratória, mas pelo movimento de seus lábios, dançando. Seus olhos que ora saltava para cima enquanto sorria e gesticulava seus braços, fazendo dos dedos rotas invisíveis, ora o escorria vagarosamente para baixo, como se tivesse triste por algo, algo que precisaria prestar atenção fora estes sinos malditos que tocam em meus ouvidos - (...) aqui?
- Desculpa, eu não entendi a ultima coisa que você falou, poderia repetir?
- Perguntei se poderia ficar aqui até a chuva passar.
Pronto, agora sei o motivo de seus olhos tristes em algum momento de sua falácia, cujo não prestei atenção e poderá me custar caro se caso ela tocar em algum assunto. Não pensei em nada quando saiu a frase súbita que me redimiria da bobagem que perguntei antes.
- Claro, entre, a casa é sua.
Sinalizei com a palma de mão esquerda a riste mostrando a sala, enquanto a minha mão direita apertava a maçaneta tão forte que já não sentia meus dedos e na minha cabeça estava a frase que não esquecia. Preciso não parecer bobo, repeti inúmeras vezes enquanto ela passava por mim sorrindo.
Seu cheiro chegou até mim desrespeitosamente, sugerindo-me pensamentos que seria inapropriado transcrever aqui, então, permito que imaginem o que um homem solteiro, morando sozinho no auge dos seus vinte e nove anos, que acabara de abrir a porta para uma estonteante desconhecida, que a pouco pedira abrigo para livrar-se da chuva, enquanto passa por ele molhada e exalando seu perfume e sorrindo timidamente. Posso afirmar que, mesmo não sabendo o que imaginara, foi bem mais intenso que isto.
Fechei a porta, dispus a tirar seu casaco molhado enquanto lhe oferecia um chá quente. Ponto para o bobo.
Carlos A.
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