domingo, 15 de junho de 2014

Rodrigo e os incas - Parte I

  Sentado aqui nesse quarto sem vida, onde o que me alimenta é a pequena fresta da janela, e as sobras dos restos de comida, que vem me deixar Maria às noites de quinta. Maria é minha babá, ou foi um dia, que por piedade de me ver assim, continua a me alimenta de comida e de tinta.
  Meu nome é Rodrigo e resolvi me isolar, Deus sabe porque, e talvez você também saiba.
Sou pintor, poeta e para os que gostam de falar dos outros, louco também. Apesar de não achar que a loucura seja assim tão ruim, louco é quem perde tempo. Eu não perco!
  A princípio, Maria veio ontem me deixar uma caixa grande, dentro havia um recipiente com comida que devo economizar para a semana toda, algumas cores de tinta que já havia acabado, e um caderno, cujo mais me agradou. Sua capa era a gravura de um gato preto, não sei quantas folhas tem, não sei qual sua marca, nem sei se é um caderno mesmo, ainda não tive coragem de abri-lo. Os olhos do felino são horrendos, e o miado dele é de quem está com fome, temo que ele coma minha comida. Posso ouvi-lo mesmo tendo fechado a caixa e posto em cima uma tela ainda inacabada. Acho que devo estar delirando, minha mãe disse que tenho um sério problema, deve ser insônia. Preciso dormir.
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  Ela sempre dizia que tenho um problema, manias, muitas manias. Acabei de retroceder 24 horas no relógio quando acordei a pouco. Todas as tardes faço isso, quase que por impulso. Uma rotina baseada em acordar 14:00, levantar, pegar o despertador atrasar em 1 dia, sentar e começar a escrever nessa máquina velha, onde todas as quintas Maria vem e recolhe todas os escritos. Maria é minha tia e irmã de minha mãe, que esqueci seu nome de tanto tempo que não a vejo.
O meu terapeuta Gabriel me aconselhou que escrevesse sobre mim, e não criar estórias, enfatizando o "E" acompanhado dos dedos indicadores e médios unidos das duas mãos descendo e subindo lentamente até o fim da palavra, ele é um bom terapeuta, me visita sempre que pode. Então Maria em uma dessas quintas trouxe-me essa máquina que era de meu pai, o ocupado Sr. Gabriel.
Uma de muitas manias adquirida com o tempo foi a do esquecimento, fui contemplado por Deus por não lembrar de muitas coisas. Pois a mim são largas as possibilidades imaginárias de como vim parar aqui, de quem sou filho, de quem sou pai, de quem acredito. Isso é de uma poesia particular e única que admiro em mim e que não desprende de minha pele. Levo uma boa vida assim.
Para meus leitores que são exigente de detalhes minuciosos, aviso-lhes que irei discorrer longas falacias quando desnecessário, e quando em situações de suma importância para a certeza de um pensamento, irei faltar de tais detalhes essenciais. Infelizmente as coisas se confundem em minha cabeça, e não quero fantasiar nada aqui. O meu tempo é diferente do tempo dos incos - nomeei assim os sem criatividades mentais, julgadores, e os que não acompanham meu pensamento - preciso de vossa compreensão, irei assim aos poucos desvendar-me, me mostrarei sem pressa, e espero me conhecer simultaneamente com você que não sabe quem eu sou. Se você está lendo isto, então isto é para você, e se discordar, de nada adianta, pois eu escrevo para todos aqueles que leem, e se você começou, então eu estou escrevendo unicamente para você. Tome então conhecimento de que eu não quero que continue, mas se ainda insistir, a culpa é totalmente sua.
Arrisco ainda esbravejar um grito inerte, daqueles que só se ouve quem tem ouvido atento, apurado, quase que treinado para tais ocasiões. Um grito que não tem pretensão de se fazer audível, tampouco tem premências catastróficas. Categorizaria-o como grunhido se um dia for necessário, pois sou porco, sou vil, ignóbil, asqueroso, não digno de pena dos mais sensíveis, muito menos digno de retalhamento dos menos calmos, mas digno de compreensão sobrenatural. Permita-me então contar minha história torta em alguns momentos, mas o tempo inteiro reta perante as minhas ideologias, que como já deveras ter percebido são de muita imaginação.
Tenho tido corriqueiramente um sonho estranho, onde eu era o sol e iluminava todos os incos do mundo, era o deus sol. Ajoelhavam-se para mim, no sonho, e me clamavam por luz. Sou um ser iluminado e eles não são, pois vivem para achar respostas para tudo, buscando conhecimento, dinheiro. Não percebem porém que a verdadeira luz é proveniente da ignorância e da imaginação. Um dia eles deixarão de ser incos quando perceber que a verdade absoluta não passa de uma utopia do mundo são.

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